domingo, 3 de outubro de 2010

Das coisas incríveis que vi (parte 1)

Uma das experiências mais incríveis que eu tive na minha vida foi quando, em 2004, eu assisti o Branford Marsalis Quartet ao vivo em São Paulo.
Eu ainda não escrevia aqui, por isso não há um texto documentando o que foi aquilo.
Naquele sábado, eu iria conhecer um dos meus ídolos (que são pouquíssimos) e ia assistir, de perto e ao vivo, um dos grupos mais impressionantes que eu conheço.
Naquele sábado, eu e Ana chegamos em Sam Paulo de manhã, nos encontramos com o Branford no hotel de tarde e passamos horas conversando. Falando sobre música, footbal, coisas sérias, besteiras, de tudo. Do hotel, encontramos a banda e fomos jantar. E do jantar pro show. Drita do Cavaco foi testemunha desse show também. Eu não tenho palavras pra descrever o que foi aquele dia. Não só pela amizade que se criou mas pelo privilégio de assistir aquele show e aquela banda.

Depois, em 2006, vi outro show do grupo, nos EUA. Mais uma vez impressionante ver como os quatro (Branford Marsalis, Joey Calderazzo, Eric Reeves e Jeff "Tain" Watts) conversavam no palco. Como se divertiam, e que energia impressionante saia daquela música incrível.

Por causa do meu descuido de saúde na viagem pra Europa em 2008, eu perdi a oportunidade de ver esse quarteto por uma última vez em São Paulo. Fiquei sabendo depois que o show foi adaptado pra ser um pouco mais pop pra plateia que aguardava o show da Chaka Kahn, mas que foi excelente ainda assim.

Pouco depois disso o quarteto foi alterado. A saída de Jeff Watts abriu caminho pra revelação de Justin Faulkner. O quarteto novo ainda não gravou nenhum disco e eu só ouvia falar do novo baterista.

Pois ontem eu fui ao Jazz at Lincoln Center assistir o show do novo BMQ.
Por mais que eu tenha percebido a grandeza do grupo em 2004 da primeira vez que eu os vi, na época era tudo muito impressionante, novo e arrebatador, e essa foi a impressão que ficou do grupo.
Por mais que eu tenha confirmado a força que o quarteto tinha em 2006, outras coisas incríveis estavam acontecendo ao mesmo tempo na minha vida, e a impressão do grupo estava misturada aos outros acontecimentos.
Dessa vez não... dessa vez foi só eu, olhando e ouvindo os quatro no palco. Tocando como se não houvesse amanhã. Tocando como se essa fosse a última e única chance de expressar tudo o que cada um deles tem passando por suas cabeças, corações e corpos. Tocando como se aquela plateia fosse a única privilegiada no mundo a interagir com eles. Tocando como se precisassem desafiar, se defender, elogiar e conversar uns com os outros. A energia que cada música trazia era totalmente diferente, mas igualmente forte. Fosse nas músicas novas (duas pancadas) que ninguém da plateia conhecia mas já gostava. Fosse na balada do último disco que é de fazer qualquer um se arrepiar. Fosse no standard pra encerrar a noite, a força daquele som é uma coisa indescritível. Ainda arrebatadora e impressionante.
Mas o mais assustador é que, no meio de toda essa energia, de toda essa comunicação dos quatro com eles próprios e com a plateia, misturado em toda aquela força tem, de fato, música. Tem uma melodia. Tem um sentido. Não é simplesmente demonstração de técnica, energia e força. É tudo isso embalado num maravilhoso pacote de música. Música pra qualquer gosto. Música pra quem gosta de jazz ou não. Música pra quem gosta de dançar ou não (em muitos momentos durante o show, seria muito possível todo mundo levantar e dançar). Música pra quem gosta de música.

Fui repetir a dose hoje. Dessa vez convidado, e com a Brenda junto (que, até onde eu sei, não é fã de jazz, assim como a Ana não era quando foi assistir o quarteto comigo em SP).
O show de hoje foi tão maravilhoso quanto o de ontem. Caminhando perfeitamente por um roteiro que se abriu com uma das músicas novas, seguiu por um Thelonious Monk (Teo), revisitando um clássico do próprio Branford (In The Crease), numa reinterpretação surpreendente (segundo o próprio, graças ao estilo do novo baterista), e encerrando com a minha preferida do último disco (Sando), que é uma longa performance que abre com um solo de baixo (palco limpo pro Eric Reeves fazer o que quisesse nele), recebe lentamente as entradas do piano e bateria, cresce até a aparição do soprano, cresce ainda mais até a aparição de um segundo tema que encerra a música.

E assim terminou a noite pra mim (o show do Terrence Blanchard ia começar pouco depois, mas não tinha espaço pra ele nos meus ouvidos hoje). Dali foi confraternização. Foi rever os músicos, trocar bobagens com Rob e Rod sobre som, sobre produções e sobre mais bobagens, rever a Nick, jantar, me despedir mais uma vez de pessoas com quem eu adoraria ter muito mais contato mas a distância é grande, e vir pra casa escrever sobre o assunto.

Não cabe tudo num post só porque cada assunto é um assunto diferente, e se esse já está grande, imagina se eu resolvesse continuar escrevendo aqui. Quem quiser continuar lendo, pule para os próximos.

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